domingo, 12 de dezembro de 2010

Costura ao quente

Na sua doçura foi deitar-se perto dele.

Ficou ali a escutar a honradez da narração dura e forte.

Não é para qualquer uma ser assim, só fazer-se. Costurar-se.

Tarefa difícil é ficar ali.

Fez vergonha doutra correr léguas, porque não tinha sido capaz de suportar triz de costura repetida. Repetição, por vezes, cansa muito.

Mas ela ali. Encostada nele. Ouvia com o coração. Via que tinha de dividir-se. Pensava como faria pra agradar aos filhos. Agrado de maezinha pequena. Pequena-grande.

Levantou-se após as costuras e foi até a sala, onde a outra estava. A outra havia voltado. Caído em si.

Ela, na sua doçura consoladora, comentou: "ficar assim esquenta". Referia-se a deixar o filho deitar-se no seu peito e se pôr a contar as histórias...

Outra já havia reparado no quente. Deitava-se com ele sempre procurando a quentura. De repente ocorreu - à outra - que a quentura era o masculino.

A mãezinha responde: "num é o amor?"
Foi o que ela disse.

É, foi.




Para Verônica.

3 comentários:

Ruth disse...

Fez vergonha doutra correr léguas, porque não tinha sido capaz de suportar triz de costura repetida. Repetição, por vezes, cansa muito".

Lindo demais Carol, me lembrou as ressonâncias do ouvir contar dos meninos que, aparentemente, são repetições da vida cotidiana de todos nós. Por iso as vezes cansam.

Paula Zilá disse...

Que gostoso, minha querida irmazinha!
tão acalentadora tua escrita, tão sutil e precisa!

te gosto demais da conta, minha mineirinha tão particular!

Carla Jaia disse...

a sua mansidão e a sua intensidade. não é assim esse amor de que vc fala? que grita vermelho fazendo-se manso?